Os ensaios clínicos são estudos realizados em doentes humanos para investigar se uma terapia é segura e eficaz. Numa fase inicial, os ensaios centram-se na segurança. Conforme se determina que a terapia é segura, são recrutados mais doentes para mais ensaios. Os investigadores começam a investigar a eficácia da terapia e questões mais específicas sobre a dose, a duração do efeitos e os efeitos secundários. É necessário que os investigadores mantenham as entidades reguladoras informadas dos resultados e de quaisquer acontecimentos adversos imprevistos.
Porque precisamos dos ensaios clínicos?
Podemos submeter uma terapia a ensaios clínicos por vários motivos.
- A terapia é nova e ainda não foi testada em humanos. Durante o seu desenvolvimento, as novas terapias têm de ser submetidas a testes cuidadosamente monitorizados em humanos para garantir a sua segurança e eficácia. Chamamos a estes testes de “ensaios clínicos”. Nesta fase, chamamos ao tratamento de “tratamento experimental”. Os doentes que são considerados candidatos adequados para receber um novo medicamento podem ser convidados a participar num ensaio clínico, com a supervisão de uma equipa de profissionais de saúde.
- A terapia está aprovada para o tratamento de uma doença específica em doentes de um grupo demográfico específico; por exemplo, os primeiros ensaios a um novo medicamento são frequentemente realizados com doentes que vivem com a doença em causa e com idades entre os 18 e os 65 anos. Os investigadores têm de realizar mais ensaios clínicos para avaliar se o tratamento é adequado para outros grupos (por exemplo, crianças pequenas, pessoas com outras doenças concomitantes ou pessoas que estão a fazer outro tratamento).
- O tratamento foi aprovado para um contexto ou problema específico e os investigadores estão a estudar se também pode ser benéfico em outras situações ou para outros problemas (por exemplo, para verificar se uma terapia autorizada com efeitos anti-inflamatórios pode ser utilizada para tratar problemas inflamatórios de forma segura e eficaz). Estes estudos também têm de ser validados através de ensaios clínicos. Neste contexto, o tratamento também pode ser descrito como experimental, mesmo que exista aprovação pelas entidades reguladoras em outros contextos clínicos.
- O tratamento foi aprovado e os investigadores estão a investigar um novo método para administrar o tratamento (por exemplo, em comprimido, gel, injeção, etc.). Mesmo que uma terapia tenha passado por todo o processo regulamentar e que a sua aplicação clínica tenha sido autorizada, o novo mecanismo de administração tem de ser avaliado através de ensaios clínicos antes de poder ser utilizado como rotina na prática clínica.
As terapias que estão a ser estudadas através de ensaios clínicos podem ser chamadas de “terapias experimentais”. Também podem ser chamadas de “terapias não comprovadas”, uma vez que ainda não foram validadas para aplicação clínica. No entanto, não devem ser confundidas com “terapias não autorizadas”, que não são apoiadas pela investigação ou por evidências científicas. Os profissionais que oferecem terapias não autorizadas podem estar a aproveitar-se de vazios legais para evitar manter os padrões de segurança ou podem dar às entidades reguladoras informações incorretas ou deturpadas. Assim, estas terapias não são sujeitas à mesma supervisão das terapias experimentais. Pode ler sobre os riscos das terapias não autorizadas aqui.
Quais são as fases dos ensaios clínicos?
Para trazer uma terapia do laboratório para a prática clínica – um processo conhecido como “investigação translacional” – os investigadores têm de concluir uma série de ensaios clínicos cuidadosamente monitorizados para avaliação da eficácia e segurança. Este processo é constituído por várias fases. Se alguma fase revelar que a terapia não tem o efeito desejado ou que acarreta um risco elevado inaceitável relacionado com os efeitos adversos, o ensaio é interrompido.
Nesta secção, iremos descrever de forma breve e geral o processo de realização de ensaios clínicos. Para mais informações sobre as investigações a decorrer a nível de uma doença ou sistema de órgãos em específico, pode consultar a secção “Usos atuais e potenciais”. Pode também consultar uma descrição mais detalhada do processo de realização de ensaios clínicos abaixo.
A parte inicial dos ensaios clínicos – a fase pré-clínica – é realizada em laboratório, utilizado células e tecidos humanos. Isto permite aos investigadores estudar de que forma as células humanas reagem a uma terapia e começar a reunir informações sobre a segurança e a eficácia num ambiente muito controlado. A secção “Métodos e Ferramentas” contém mais informações sobre como os cientistas conseguem criar “modelos” do tecido humano em laboratório.
A fase seguinte dos ensaios pré-clínicos são os estudos em modelos animais. Os investigadores estudam se a terapia tem o efeito clínico desejado num animal vivo, algo muito mais complicado do que um modelo celular. Os investigadores também avaliam a segurança da terapia, registando os efeitos com doses diferentes e se é identificado algum efeito secundário. Os estudos podem ser repetidos em animais diferentes para afinar os resultados antes de avançar para os ensaios clínicos em humanos.
Os ensaios clínicos são divididos em várias fases, cada uma delas concebida para obter informações claras, exatas e específicas sobre a eficácia e a segurança da terapia experimental. O número de participantes num ensaio aumenta gradualmente se for demonstrado que a terapia é segura e eficaz.
Fase 0: Algumas terapias experimentais novas são testadas num grupo muito pequeno de voluntários saudáveis antes de começar o ensaio nos doentes. O objetivo é confirmar que a terapia atua conforme esperado no organismo humano. Nesta fase, o ensaio é também conhecido como ensaio de “Pré-fase 1” ou de “Prova de conceito” (“Proof of concept”).
Fase 1(I): Os participantes (doentes e voluntários saudáveis) recebem doses diferentes da terapia. O objetivo nesta fase é determinar a segurança das diferentes doses e compreender de que forma a terapia é metabolizada pelo organismo e qual é a sua taxa de metabolização.
Fase 2(II): A terapia é administrada a um grupo maior de participantes (doentes). O objetivo é avaliar a eficácia da terapia a nível dos sintomas e da qualidade de vida a curto prazo.
Fase 3(III): A nova terapia é administrada a um maior grupo de participantes (doentes), entre algumas centenas e alguns milhares. O objetivo é comparar a nova terapia a um tratamento já existente, para determinar se é mais eficaz do que o tratamento padrão e se existem alguns efeitos secundários importantes. (Se não existir nenhum tratamento, a terapia será comparada a um placebo – um tratamento que não deverá ter qualquer efeito terapêutico, como um comprimido de açúcar. Isto é feito para ter em conta o efeito placebo, um fenómeno bem documentado que indica que as pessoas que acreditam que estão a receber cuidados médicos se sentem melhor e têm um alívio dos sintomas. Os participantes são informados no início de um estudo que poderão receber o placebo. É pouco provável que os participantes que recebam o placebo obtenham qualquer benefício direto da participação no ensaio.)
Fase 4(IV): Os investigadores continuam a recolher dados sobre a terapia depois de esta ter sido aprovada e estar disponível para prescrição. O objetivo é avaliar os efeitos a longo prazo da terapia numa população ampla. Esta fase não é obrigatória para todas as terapias.
Recusar-se a participar num ensaio clínico não deve afetar o seu padrão de cuidados. Não é habitual que os doentes paguem para participar num ensaio clínico.
Nota: as fases de um ensaio clínico podem ser escritas em numeração árabe ou romana. Para consistência, será utilizada a numeração árabe neste website.
Quais são os desafios?
Bem-estar dos participantes: Os ensaios clínicos só podem avançar graças à generosidade dos participantes voluntários. Os investigadores têm o dever de cuidar dos participantes e a responsabilidade ética de dar prioridade ao bem-estar dos participantes sobre os interesses da investigação ou sobre quaisquer interesses em conflito que possam surgir. Chamamos a este conceito de “primazia do ser humano”.
Gestão de riscos: Apesar de serem cuidadosamente monitorizados, os ensaios clínicos são, por natureza, mais incertos do que os tratamentos aprovados. Os participantes podem apresentar efeitos secundários imprevistos. Pode ser necessário retirar um doente de um ensaio. Se a equipa de investigação clínica decidir que os riscos ultrapassam os possíveis benefícios para os doentes, o ensaio pode ser interrompido sem avançar para a fase seguinte. Este é um aspeto valioso do processo de realização de ensaios clínicos e previne a exposição de mais doentes a riscos desnecessários.
Limitações dos ensaios: Os ensaios clínicos são concebidos para estudar uma terapia em casos específicos, e a terapia só pode ser considerada cientificamente validada nesses casos. Um tratamento comprovado como seguro numa população (por exemplo, adultos jovens) tem de ser considerado como “não comprovado” noutras populações com a mesma doença (como crianças ou adultos jovens com outros problemas concomitantes). Mesmo se as evidências existentes sugerirem que o tratamento deve ser seguro para doentes de outros grupos demográficos, o tratamento tem de ser submetido a mais ensaios clínicos para ser considerado como comprovadamente seguro e eficaz nesse contexto.
Um processo longo e incerto: O processo de desenvolvimento de novas terapias ou de confirmação de que as terapias existentes são seguras em novos contextos é longo. As terapias celulares e génicas são submetidas a uma avaliação ética e científica rigorosa durante as fases de investigação e de ensaio clínico do seu desenvolvimento. O caminho do laboratório ao doente, ou seja, desde o desenvolvimento de um tratamento em laboratório à implementação na prática clínica, demora muitos anos. Fundamentalmente, o objetivo do processo é rejeitar as terapias que não são seguras, eficazes ou adequadas; nos ensaios clínicos que estudam medicamentos, menos de 15% dos medicamentos aprovados para ensaios de fase 1 acabam por ser aprovados para aplicação clínica. Mesmo em casos de sucesso, pode levar muitos anos para uma terapia receber uma aprovação completa das entidades reguladoras, mesmo quando demonstrou ser promissora nos ensaios clínicos. Além disto, pode haver um atraso entre a aprovação de um tratamento e a sua introdução no mercado através de uma entidade nacional de saúde pública. Pode ler sobre a regulamentação das novas terapias aqui.
Avaliação ética
Os estudos que envolvem animais de laboratório ou participantes humanos têm de ter aprovação por uma comissão de ética antes de começarem. Dependendo das regulamentações locais, essa comissão de ética pode estar associada à instituição que realiza a investigação (como uma universidade ou hospital) ou a um serviço nacional de saúde. Alguns estudos podem ser submetidos a avaliações éticas por mais do que uma comissão – por exemplo, se o ensaio estiver a recrutar doentes através de um serviço nacional de saúde será necessária a aprovação da comissão de ética da instituição e da comissão de ética do referido serviço.
As comissões de ética são geralmente compostas por voluntários e normalmente incluem tanto peritos como leigos, incluindo especialistas como farmacêuticos e estatísticos. O papel destes é garantir que o estudo foi concebido de forma a ser possível obter dados válidos e relevantes com o mínimo de sofrimento, desconforto e transtorno para os participantes, e que tudo o que é pedido que os participantes façam é razoável e justificado.
Para estudos em seres vivos, a comissão terá a oportunidade de fazer perguntas aos investigadores em pessoa. É possível que a aprovação seja retida até que sejam feitas alterações específicas ao protocolo ou aos documentos para os doentes, como formulários de consentimento.
Investigação pré-clínica
O desenvolvimento de novas terapias começa no laboratório – na fase pré-clínica de investigação. São utilizados modelos celulares e tecidulares para obter uma compreensão inicial do efeito de uma terapia.
Os modelos simples podem envolver um único tipo de célula. São normalmente utilizados nas fases mais iniciais da investigação, para confirmar que as células humanas vão tolerar esta terapia. Isto também permite aos investigadores examinar as células-alvo num ambiente controlado e simplificado. A comparação posterior de modelos mais avançados e complexos com estes modelos simples permite aos investigadores avaliar quais os fatores que podem alterar o efeito da terapia.
Para responder a perguntas mais complexas, os investigadores podem recorrer a modelos mais sofisticados. Estes modelos podem conter vários tipos de células. São frequentemente concebidos para refletirem as propriedades físicas e químicas de um tecido mais fielmente do que os modelos simples. Os investigadores podem utilizar estes modelos para estudar como uma terapia irá afetar um tecido-alvo ou como poderá afetar tecidos ou órgãos próximos. Dizemos que estes estudos são conduzidos “in vitro” (literalmente “em vidro”, visto que o equipamento de laboratório primitivo para cultura celular era feito principalmente de vidro). Os estudos in vitro permitem aos investigadores afinar o tratamento antes de expor um ser vivo ao mesmo. A secção “Métodos e Ferramentas” contém mais informações sobre como os cientistas conseguem criar “modelos” do tecido humano em laboratório.
Se os resultados dos estudos in vitro forem promissores, a próxima fase da investigação é realizada em modelos animais. Estudar um tratamento in vivo (literalmente, “num corpo vivo”) permite que os investigadores compreendam de que forma todo o organismo reage a um tratamento. Ao contrário dos estudos in vitro, estas investigações podem monitorizar os efeitos a jusante e o efeito de um tratamento em partes não-alvo do organismo. A terapia ou o mecanismo de administração podem ser ajustados de acordo com estas informações. Uma terapia pode ser submetida a ensaios sucessivos em modelos animais diferentes, dependendo da doença ou sistema de órgãos de interesse.
A duração habitual dos ensaios pré-clínicos e de entre 1 e 5 anos, apesar de poder ser superior. Quando os investigadores conhecem rigorosamente a segurança e eficácia num modelo animal relevante, a investigação é candidata a avançar para a fase clínica.
Ensaios clínicos
A investigação clínica é realizada em seres humanos para avaliar uma nova terapia ou uma nova forma de utilizar uma terapia aprovada. Os ensaios clínicos são divididos em várias fases, concebidas para obter respostas claras e exatas a perguntas específicas em cada fase. O número de participantes aumenta gradualmente conforme são obtidas mais informações sobre a eficácia e segurança de uma terapia. Os investigadores têm de obter a aprovação de uma comissão de ética para avançar para a nova fase do ensaio. Um ensaio clínico habitual tem uma duração de entre seis e sete anos.
Cada fase do ensaio inclui um grupo de “controlo”. O membros deste grupo de controlo não recebem a terapia em estudo. Em vez disso, recebem ou a terapia padrão existente, se existir, ou um placebo. A experiência do grupo de controlo deve ser a mesma da do grupo a receber a terapia (o grupo de “tratamento”) para que os doentes não saibam em que grupo estão; por exemplo, podem tomar comprimidos de açúcar ou ser-lhes injetado um agente não terapêutico.
Os dados recolhidos do grupo de controlo servem como referência. Se for detetada uma diferença entre o grupo de controlo e o grupo de tratamento, os investigadores podem atribuir esta diferença ao efeito da terapia experimental. Se os resultados em ambos os grupos forem semelhantes, isto sugere que o efeito é causado pelo efeito placebo (ou seja, sentir um efeito positivo nos sintomas devido à crença de que se está a receber tratamento) e não pela terapia experimental.
Nas situações em que tal for possível na prática, não será dito aos participantes se estão a receber a terapia experimental ou o placebo/terapia padrão. Chamamos a isto um “ensaio em ocultação”, e tal é feito para evitar que as expectativas inconscientes afetem os resultados. Num ensaio em dupla ocultação nem os participantes nem os investigadores que administram a terapia e recolhem os dados sabem qual o tratamento que um doente em específico está a receber enquanto o estudo está a decorrer.
Fase 0: Em alguns casos, as terapias experimentais novas são testadas num grupo muito pequeno de voluntários saudáveis antes da Fase 1 começar formalmente. O objetivo desta fase é determinar se a terapia tem quaisquer efeitos nos humanos que não estavam previstos com base nos resultados dos estudos em animais, para prevenir quaisquer acontecimentos adversos imprevistos. Chamamos também a estes ensaios de “Pré-fase 1”, “Prova de conceito” (“Proof of concept”) ou “Primeira administração em humanos” (“first-in-human”).
Fase 1
Os ensaios de Fase 1 têm geralmente menos de 50 participantes e podem mesmo ter menos de 10, dependendo da natureza do estudo ou da incidência da doença em questão. Os participantes podem ser doentes ou voluntários saudáveis. Diferentes grupos de doentes recebem diferentes doses ou concentrações da terapia administrada.
O objetivo desta fase é avaliar a segurança das diferentes doses, para compreender até que ponto afetam o organismo e para determinar a taxa de metabolização das mesmas. Nesta fase, os investigadores vão determinar a dose efetiva mínima (a dose mais baixa que tem de ser administrada para se verificar efeito terapêutico) e a dose máxima (a dose acima da qual não se verificam alterações no efeito ou acima da qual a terapia já não é segura ou tolerada).
Fase 2
A Fase 2 é realizada numa coorte maior de doentes – habitualmente entre 80 e 100. Os investigadores avaliam o efeito da terapia nos sinais e sintomas da doença. Nesta fase também podem ser avaliados os efeitos das várias doses nos sintomas da doença.
O objetivo desta fase é estabelecer se esta terapia melhora os sintomas dos doentes a curto prazo (em meses, e não num período prolongado).
A tolerância e o efeito da terapia na qualidade de vida dos doentes também são avaliados nesta fase. Para além de realizarem exames clínicos e de avaliarem os resultados de saúde, os investigadores podem fazer entrevistas aos doentes, colocando perguntas sobre a sua experiência pessoal da terapia. Isto permite-lhes ajustar o protocolo e estabelecer expectativas razoáveis para participantes futuros em termos de possíveis benefícios ou inconvenientes da participação.
Fase 3
Na Fase 3, a nova terapia é administrada a um maior grupo de participantes (doentes), entre algumas centenas e alguns milhares.
A nova terapia é administrada a um grupo maior de participantes (doentes), que inclui milhares de pessoas. O objetivo é comparar a nova terapia a um tratamento já existente (ou a um placebo, se não existir tratamento), para determinar se é mais eficaz do que o tratamento padrão e se existem alguns efeitos secundários importantes.
Fase 4
A Fase 4 é realizada depois de a terapia ter sido aprovada e de estar disponível para prescrição. Não é obrigatória para todas as terapias.
Na Fase 4, os investigadores continuam a recolher dados sobre a terapia de doentes a quem esta foi prescrita como parte do tratamento de rotina. O objetivo é avaliar os efeitos a longo prazo da terapia, incluindo a duração dos efeitos positivos e o aparecimento de efeitos adversos a longo prazo.
Um período de tempo adequado para a recolha contínua de dados é habitualmente discutido com uma comissão de ética e aprovado pela mesma.
Ensaios clínicos em curso
Os investigadores estão atualmente a estudar várias novas terapias celulares e génicas, tanto em laboratório como através de ensaios clínicos. Para mais informações sobre investigação de uma doença ou de tecidos específicos, consulte as nossas fichas informativas específicas da doença.
Se lhe for proposto que participe num ensaio clínico, é importante que leve o tempo de que precisar a tomar uma decisão e que esteja confortável com a sua escolha. Se tiver quaisquer perguntas ou preocupações relacionadas com um tratamento que lhe foi proposto, estas perguntas podem ser-lhe úteis para começar uma conversa com o seu prestador de cuidados de saúde. A equipa de investigação deve também dar-lhe a oportunidade de fazer perguntas sobre o estudo. Também pode ser benéfico para si contactar associações de apoio a doentes e fazer perguntas a membros destas associações sobre a sua experiência na participação num ensaio clínico.
Recusar-se a participar num ensaio clínico não deve afetar o seu padrão de cuidados. Não é habitual que seja pedido aos doentes que paguem para participar num ensaio clínico.
Porque me foi proposta uma terapia em investigação não aprovada?
Os ensaios clínicos são realizados para responder a perguntas de investigação muito específicas. Isto significa que quando uma terapia conclui o processo de realização ensaios clínicos é aprovada para utilização apenas nesses casos específicos. Há várias razões legítimas pelas quais pode ser proposto ao doente um medicamento que ainda não está aprovado para o tratamento da sua doença.
Estudar os efeitos de uma terapia aprovada numa nova população de doentes.
Pode ser necessário repetir alguns ensaios clínicos em subpopulações diferentes para confirmar a sua eficácia e segurança. Por exemplo, uma terapia aprovada para idosos não está automaticamente validada para crianças. Os ensaios clínicos podem ser realizados de forma interativa para permitir a inclusão de doentes com perfis mais complexos, para avaliar a segurança e a eficácia do tratamento em doentes com vários problemas de saúde.
Novas formas de administração de terapias aprovadas.
Para investigar novos métodos de administração de uma terapia, é necessário repetir os ensaios clínicos. Isto é feito para confirmar que os efeitos e a sua duração com a nova administração são comparáveis aos do método validado e para identificar a natureza e a frequência de quaisquer efeitos secundários associados ao novo método.
Estudar se uma terapia aprovada para uma doença pode ser usada para tratar outra doença.
Uma terapia pode ser redirecionada para o tratamento de outra doença. Isto pode dever-se às duas doenças apresentarem sintomas ou terem mecanismos de ação semelhantes. Também pode dever-se ao facto de um efeito secundário da terapia ser benéfico noutro contexto.
Quando uma terapia aprovada está a ser estudada noutro contexto clínico, pode ser dada autorização aos investigadores para não realizarem os ensaios clínicos de Fase 1, visto que o perfil de segurança já foi estabelecido.
Infelizmente, algumas organizações vão explorar a ambiguidade da ideia dos tratamentos “não comprovados” ou “em investigação” e oferecer aos doentes terapias que não são apoiadas por evidências científicas. “Terapias experimentais” são as que ainda não receberam a autorização de introdução no mercado, e que estão atualmente a ser estudadas através de ensaios clínicos com o objetivo último de serem aprovadas pelas entidades reguladoras. O conceito de “terapias não comprovadas” é mais amplo, incluindo todas as terapias que ainda não receberam uma autorização de introdução no mercado.
As “terapias não autorizadas” são terapias que não passaram pelo processo formal de revisão por pares ou que não cumpriram com os requisitos das entidades reguladoras. Estas terapias não têm a mesma supervisão das entidades reguladoras e das comissões de ética das terapias experimentais. Pode ler mais sobre os riscos das terapias não autorizadas aqui.
Uma nota sobre a utilização de medicamentos fora da indicação (off-label)
Um médico tem a liberdade de prescrever aos seus doentes qualquer medicamento aprovado como parte do tratamento, mesmo se a utilização desse medicamento não estiver autorizada nas circunstâncias específicas do doente. Esta utilização pode estar bem estabelecida na literatura médica (por exemplo, em estudos de caso publicados) e ser considerada segura e adequada pela comunidade médica. Os medicamentos podem ser amplamente utilizados fora da indicação num contexto específico antes de esta utilização ser formalmente estudada num ensaio clínico. Um exemplo bem conhecido é a utilização de betabloqueadores, um tipo de medicamento aprovado para o tratamento da hipertensão e da arritmia cardíaca, para o tratamento da ansiedade. Como estes medicamentos concluíram o processo de realização de ensaios clínicos e foram avaliados pelas autoridades reguladoras e comissões de ética relevantes, a utilização fora da indicação não é considerada como uma terapia não autorizada.